Em 1969, a guerra civil de Espanha já tinha terminado há mais de três décadas. Francisco Franco, que liderou as forças nacionalistas até à vitória nessa sangrenta contenda, era o líder supremo e indisputado do país. Restava a dúvida, contudo, sobre o que se passaria depois da sua morte.
Há que lembrar, para se compreender bem a situação, que as forças nacionalistas que venceram a guerra não eram uniformes. Ao lado dos elementos do exército regular, combateram milhares de falangistas, seguidores de uma ideologia muito semelhante ao fascismo italiano e que incluía uma significativa corrente republicana de direita.
Lutaram também voluntários católicos que, simplesmente, não se reviam no regime que levou a cabo a maior perseguição à Igreja Católica de história de Espanha; monárquicos constitucionalistas, defensores do regime que imperou até à abdicação de Afonso XIII, e os lendários requetés, monárquicos tradicionalistas defensores da dinastia carlista.
Franco acabou por tomar uma decisão peculiar. Restaurar a dinastia de Afonso XIII, sim, mas não na pessoa do então herdeiro Juan, conde de Barcelona. O professor e historiador Mendo Castro Henriques, explica que “existiu um acordo tácito entre o conde de Barcelona e Francisco Franco de que seria instaurada a chefia de Estado real, mas com um rosto novo”, uma vez que Franco não confiava em Juan de Bourbon para manter o seu regime autoritário.
Por isso, quando no dia 22 de Julho de há 40 anos Franco tornou pública a decisão de que o jovem príncipe Juan Carlos lhe sucederia no poder, não foi grande a surpresa.
"A decisão era esperada, mas não se sabia a identidade que Juan Carlos criaria. Juan Carlos viveu até aos dez anos em Portugal com seus pais, de quem recebeu os princípios da monarquia parlamentar. Depois, foi para Espanha, a fim de ser educado como herdeiro do trono e comandante das forças armadas. Durante os anos do fim do franquismo, foi visto como um ‘bom aluno’ de Franco. Mas o próprio generalíssimo galego foi enganado. Juan Carlos construiu a sua identidade e rede de contactos que lhe permitiram liderar a transição democrática”, explica o professor da Universidade Católica e do Instituto de Democracia Portuguesa.
Esta identidade de Juan Carlos revela-se, já Rei, quando põe fim ao levantamento militar que protestava contra a democratização do país. Aí, torna-se definitivamente Rei, não só dos monárquicos, mas de todos os espanhóis, passando a contar com a fidelidade até do partido comunista.
O seu pai, o Conde de Barcelona, morreu em 1993, 28 anos depois de Franco, o homem que o impediu de ser Rei, mas que não pode impedir que a sua visão para Espanha se concretizasse.
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